A VEZ DA PECUÁRIA OVINA: O PROCESSO DE RESSIGNIFICAÇÃO DA CARNE E SUAS POTENCIALIDADES
Por Etho Medeiros*
Foto acima: Vitrine da Carne Ovina Expointer.
Nos últimos anos, aspectos ligados a qualidade dos alimentos protagonizaram discussões que envolvem a relação entre o consumidor final e os produtores. Os consumidores passaram a ser mais exigentes e a demandar a forma como os alimentos eram produzidos e os seus respectivos significados. De forma concomitante, esse cenário também pode ser observado na produção de carne ovina. Historicamente, o consumo de carne ovina esteve fortemente ligado a fatores culturais ou regionais, como no caso das regiões de criação de ovelhas no Sul do Brasil. Entretanto, a partir da década de 1980, o mercado nacional passou por transformações, com a expansão e consolidação de novas regiões produtoras (Regiões Centro-Oeste e Norte) e a emergência de novos mercados consumidores (Região Sudeste).
Antes tido como um produto majoritariamente regional, rústico e ligado a sistemas de produção secundários, a pecuária ovina experimentou a expansão do seu mercado por meio de fatores ligados a qualidade do produto, maior poder aquisitivo da população, formação de mercados mais exigentes, diferenciação e oferta dos produtos, certificação e selos de qualidade, inovação comercial e público consumidor mais urbanizado. Essa nova realidade pode ser percebida na maior utilização da carne ovina em espaços gastronômicos mais sofisticados (gastronomização da carne) e em mercados consumidores localizados em grandes centros urbanos.
Com isso, nos habituamos com a presença mais constante de cortes de ovinos na gastronomia e na alta culinária (principalmente paleta, o carré, costela e pernil). Certamente, a mídia, os discursos culinários e gastronômicos, os livros, os programas televisivos, as receitas, e os manuais e guias; igualmente, foram instrumentos eficientes e necessários para a composição desse cenário por meio do apelo gastronômico. Esse incremento na oferta esteve lastreado na formação de uma demanda mais exigente e que busca, acima de tudo, qualidade do produto e experiência gastronômica inigualável.
Desse modo, é prudente afirmar que há uma mobilização em torno da (re)valorização da carne ovina em meio a certos significados de qualidade, e que vão ao encontro a demandas orientados pelas novas lógicas de consumo. Basta observar as práticas produtivas utilizadas até então, que foram sendo modificadas para atender a esse novo mercado: a carne de ovelha ou animais mais velhos passou a ser substituída pelo cordeiro; a mudança das raças utilizadas e do padrão genético foi gradual; o surgimento de novos cortes comerciais e subprodutos foi incentivado; e a reorganização
da cadeia foi viabilizada para atender a demanda por meio da oferta frequente (menos sazonal) e em maior escala.
Esse cenário denota a possibilidade de uma janela de oportunidade para os pecuaristas e uma forma de alavancar o consumo e a produção de carne ovina. Ainda hoje, um dos principais gargalos para o consumo são a pouca disponibilidade do produto no mercado, pouco hábito no consumo (12% da população nunca consumiram carne de ovinos), e falta de cortes adequados e comerciais adequados ao prepara no dia a dia (Revista Embrapa Pecuária Sul, 2018). Entretanto, se observa que o mercado cresce nos últimos anos. Segundo dados preliminares do Censo Agropecuário de 2017, o mercado de ovinos teve expansão de 47,2% em um período de 10 anos (2006-2017) (IBGE, 2017). Além disso, em 2018, o mercado da carne ovina mobilizou 41,6 milhões de dólares, representando 76,4% de tudo que foi produzido na pecuária ovina (CIM, 2018).
Logo, como resultado dessas transformações, temos as mudanças nas dinâmicas e práticas produtivas que devem ser empregadas pelos pecuaristas para o atendimento dessa nova demanda. Nesse sentido, surgem processos que residem cada vez mais na capacidade de criar oferta de produtos cárneos ovinos para diferentes mercados, desde nichos altamente especializados (tradicionais e sensoriais) e de alta gastronomia a mercados de consumo em massa. Atender a esses pontos possibilita a atividade uma maior profissionalização e agregação de valor para a atividade, de forma que se possa conquistar e formar consumidores frequentadores assíduos de restaurantes e locais de comercialização do produto. Embora haja desafios, o potencial da carne ovina é enorme!
*Etho Roberio Medeiros Nascimento. Zootecnista, Mestre em Sociobiodiversidade e Tecnologias Sustentáveis – MASTS/UNILAB, Doutorando em Desenvolvimento Rural (PGDR), na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). E-mail: ethoroberio@gmail.com
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