COMER OU NÃO COMER CARNE, EIS A QUESTÃO DO MOMENTO

Por Angela Escosteguy*

Com a tragédia das queimadas na Amazônia e arredores, aumentam as recomendações contra o consumo da carne pois é dito que para criar gado precisa desmatar e ainda, que o gado libera gases de efeito estufa. É importante saber que existem várias maneiras de criar os animais que determinam tanto seu impacto no ambiente quanto na qualidade da carne. Tudo depende de onde e como os animais são criados e alimentados. É um grande equívoco a generalização em torno do consumo de carne imaginando que todas criações são iguais.

A nossa pecuária é completamente diferente da pecuária na Amazônia e dos confinamentos. O Pampa é um bioma de pastagens nativas, portanto aqui nunca houve desmatamento simplesmente porque desde a pré-história pastagens naturais alimentaram herbívoros como os atuais capivaras, antas e veados, dentre outros.

Em relação aos gases de efeito estufa, estudos da Embapa (2018) e vários outros, mostraram que animais alimentados com pastagens emitem menos metano e que as pastagens capturam e estocam carbono assim como as florestas. Além disso, o gado a campo, bem manejado, traz benefícios ao ambiente pois fertiliza o solo com seus dejetos, sendo que inclusive vem sendo usado em vários continentes para recuperar áreas desertificadas. Aqui contribuem para a sobrevivência dos nossos animais silvestres pela preservação do bioma que vêm perdendo espaço a passos largos pelo avanço das lavouras e mineração. Biodiversidade preservada é biodiversidade que gera renda. As pastagens por sua vez, além de alimentar o gado, também realizam uma série de serviços ecossistêmicos essenciais tais como como captura e estocagem de carbono, de águas, recarga dos aquíferos e polinização.

É inegável o papel social e cultural que a pecuária tem no RS. Há mais de 3 séculos a criação de gado é a principal atividade agropecuária, convivendo em harmonia com o ambiente, gerando alimentos, trabalho, renda, fixação no meio rural e identidade cultural para milhares de pessoas. Não podemos deixar de reverenciar a maravilhosa capacidade que os herbívoros têm de transformar pasto e folhas, que são impróprias para consumo humano, em alimento nobre, vestimentas, fertilizantes, energia e tração.

Com a população em crescimento a demanda de alimentos vai aumentar. É fundamental fortalecermos formas de produção sustentáveis. O modelo de produção altamente tecnificado além de caro tem se mostrado danoso ao ambiente. Se comer é um ato político e diretamente relacionado com o ambiente, o consumo consciente nos possibilita escolher qual o tipo de carne preferimos consumir e qual tipo de criação iremos apoiar. Modelos de pecuária ecológica baseada na conservação do campo nativo contribuem para combater o aquecimento global ao mesmo tempo que atendem às necessidades alimentares, sociais e econômicas da população, conservando a sua biodiversidade. E, assim, conforme a FAO, 2019, “ a pecuária pode deixar de ser parte do problema e passar a ser parte da solução”.

*Angela Escosteguy, médica veterinária, diretora do IBEM.

Foto por Augusto Russini.

Artigo publicado no jornal Correio do Povo, em 08/09/2019.

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