A IMPORTÂNCIA DA CRIAÇÃO DE RUMINANTES NO CONTEXTO DA AGRICULTURA FAMILIAR
Por: Sebastião André Barbosa Junior *
Foto destacada: Assentamento Jardim (Moreno – PE)
Para introdução de nossa conversa vamos conhecer um pouco sobre o atual momento da criação de bovinos, caprinos e ovinos em nosso país. Ao analisar o documento “Produção da Pecuária Municipal 2018”, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), temos que o rebanho de bovinos no Brasil é de 213, 5 milhões de animais, sendo o 2º maior rebanho do mundo, 1º lugar em exportação e 2º lugar na produção de carne. Na bovinocultura de leite, o país é responsável por 33,8 bilhões de litros, sendo o 6º lugar em produção no mundo. A região que mais contribuiu para esse crescimento nos últimos anos foi a Nordeste, com destaque para o estado da Bahia. Com relação a criação de pequenos ruminantes no Brasil, o rebanho caprino apresenta 10,7 milhões de animais, sendo que 93,9% destes estão localizados na região Nordeste, principalmente nos estados da Bahia e Pernambuco. A ovinocultura conta com um rebanho nacional de 18,9 milhões de animais, também com destaque para a região Nordeste, que detêm 66,7% desse plantel, tendo o estado da Bahia também grande contribuição.
O último Censo Agropecuário realizado pelo IBGE foi em 2017, este não diferenciou os estabelecimentos agropecuários em convencional e de base familiar, mas trouxe uma informação de extrema relevância, que foi a de que mais de 80% dos estabelecimentos agropecuários do Brasil tem menos de 50 hectares (IBGE, 2018). Partindo desse dado e refletindo sobre categorias da tipologia fundiária, percebe-se que a grande maioria dos estabelecimentos agropecuários do nosso país é de pequenos e médios agricultores e agricultoras, ou seja, são de base familiar.
Ao escrever esse artigo, tenho a proposta de trazer elementos sobre o importante papel desempenhado pela criação de ruminantes no contexto da Agricultura Familiar. Sendo este modelo de agricultura compreendido a partir da Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006, que a caracteriza como uma agricultura desenvolvida numa unidade produtiva que apresente tamanho de até quatro módulos fiscais, que tenha a gestão e o trabalho realizados em sua maioria por pessoas da família e que a renda familiar seja predominantemente de origem das atividades desenvolvidas na unidade produtiva. A Agricultura Familiar é composta por pequenos e médios agricultores(as), assentados(as) de programas da reforma agrária, além de comunidades rurais tradicionais, envolvendo indígenas, quilombolas, pescadores, ribeirinhos, dentre outros povos. Esse modelo permite uma produção diversificada, onde as pessoas desenvolvam uma relação com a terra não apenas produtiva, mas social, cultural e política.
Foto: Assentamento Mato Grosso ( Moreno – PE)
Mas qual será a contribuição da criação de ruminantes no contexto da Agricultura Familiar no Brasil? Essa pergunta pode ser respondida visitando o Censo Agropecuário de 2006, que foi a primeira pesquisa estatística oficial do país que levou em conta as características da Agricultura Familiar. A partir desse estudo conseguiu-se ter uma estimativa da participação da criação de ruminantes nesse contexto. No Brasil, foram recenseados 5.175.489 estabelecimentos agropecuários. Desse total, a agricultura familiar foi responsável por 4.367.902, correspondendo a 84,4% dos estabelecimentos agropecuários do país. As regiões com mais estabelecimentos de base familiar foram a Nordeste, com 2.187.295 (50%), a região Sul, com 849.997 (19,2%), e a Sudeste com 699.978 (16%).
O segmento da pecuária foi o mais desenvolvido e a bovinocultura esteve presente em mais de 50% dos estabelecimentos recenseados. Num total de 2.673.176 de estabelecimentos com produção de bovinos, 2.151.279, ou seja, 80,48% caracterizavam-se como produções de base familiar. Desses, 831.943 estabelecimentos, em torno de 38,67% estavam localizados na Região Nordeste. A criação de bovinos no contexto da Agricultura Familiar contribuiu com mais de 40% do efetivo de bovinos no país, somando um total de 51.991.528 animais, naquele ano. Sobre a bovinocultura de leite, a produção de base familiar foi verificada em mais de 80% dos estabelecimentos desse segmento, com 1.089.413 unidades, produzindo 58% do total de leite de vaca. Indo agora para a criação de caprinos, com relação a produção leiteira, temos que 15.347 (84,4%) dos 18.063 estabelecimentos, eram de base familiar, e que naquele ano a Agricultura Familiar foi responsável pela produção de 67% do leite de cabra, correspondendo a 23.987.360 litros.
Foto: Assentamento Concórdia e Santa Crua ( São Lourenço da Mata – PE)
O Censo Agropecuário de 2006, apesar de antigo, nos possibilita projetar e relacionar suas estimativas sobre a Agricultura Familiar e a criação de ruminantes com os dados mais atuais. Essa breve análise, nos mostra primeiramente que o modelo de agricultura do nosso país é o da Agricultura Familiar, e que o Nordeste é a região que tem o maior número de estabelecimentos agropecuários desse modelo. Apesar da invisibilidade, marginalização, escassez de políticas públicas e de incentivos de uma forma geral, a criação de ruminantes em sua maioria é desenvolvida pelos pequenos e médios agricultores(as). Como ponto de reflexão e desafio, além da inquietação que os números já nos trouxeram, trago também com base no Censo de 2006, que 77,88% dos estabelecimentos agropecuários não receberam assistência técnica de nenhuma natureza. Lutar pela implantação de uma política pública permanente de ATER é fundamental para contribuir com a criação de ruminantes e para a Agricultura Familiar como um todo em nosso país.
* Sebastião André Barbosa Júnior – Médico Veterinário e licenciado em Ciências Agrícolas pela Universidade Federal Rural de Pernambuco, Mestre e Doutorando pelo Programa de Pós-graduação em Medicina Veterinária (PPGMV/UFRPE). Email: sebastiaoandre.jr@hotmail.com
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