O PAMPA PEDE SOCORRO

Carlos Nabinger*

Ecossistemas campestres ocupam 30% da superfície terrestre e estão presentes em todos continentes, menos na Antártida. Ocorrem nas mais variadas condições de precipitação (de 150 a 2 mil milímetros) e temperatura (de 0° a 25ºC). São ecossistemas pastoris, pois essa vegetação, constituída basicamente por gramíneas e outras espécies herbáceas, coevoluiu com herbívoros. No sul do Brasil, esse tipo de vegetação antecedeu a vegetação arbórea, a qual começou a avançar sobre os campos somente quando o clima tornou-se mais úmido e menos frio – há 10 mil anos.

No início da colonização europeia, os campos cobriam quase 70% do território gaúcho, o que determinou que a pecuária fosse a primeira e lógica forma de ocupação. Portanto, as bases da economia e, sobretudo, da cultura regional estão ligadas aos campos. Mas o que geralmente não consideramos é sua multifuncionalidade, ou seja, eles cumprem outras funções muito mais importantes do que a produção animal, de fibras, biocombustíveis, plantas medicinais e ornamentais etc. Seus outros empregos ecossistêmicos incluem a fornecimento de serviços de regulação climática, hídrica, controle de doenças e pragas e polinização. Mas também provê serviços culturais derivados da nossa coexistência concreta com o ecossistema (valores estéticos, educativos, turísticos, entre outros), além de serviços de suporte (sequestro de carbono, formação dos solos, ciclagem de nutrientes e produção primária). E, tudo isso, graças a uma rara e única biodiversidade.

Entretanto, somente ao final do século passado se começou a valorizar os campos por meio dos conceitos de serviços ecossistêmicos. Conceitos que, infelizmente, entre nós não estão bem compreendidos sequer por aqueles que vivem e trabalham no rural e muito menos pelos mentores de políticas públicas. Em consequência, hoje resta menos da metade da área original, altamente fragmentada e de forma desordenada, o que diminui ainda mais sua capacidade de prestação dos aludidos serviços. Ao contrário, quando existem, as políticas estão voltadas majoritariamente para os monocultivos de exportação ou mesmo para a exploração de recursos minerais, os quais representam ameaças para o bioma quando não inseridas em contexto mais holístico que considere a necessária integração de todas as atividades rurais e urbanas com a natureza que as sustenta.

Volto a insistir em educação para a natureza e ações de ordenamento territorial como necessidades urgentes para conservar ao menos parte do bioma e seus serviços e de forma economicamente sustentável. Tecnologia para isso existe, precisamos vontade política.

*Carlos Nabinger é mestre em Fitotecnia e doutor em Zootecnia, professor da Faculdade de Agronomia da UFRGS.

Texto publicado originalmente em ZERO HORA,  Caderno Campo e Lavoura, coluna Palavra do Especialista – Produção Sustentável, 24/07/2018.

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1 responder
  1. Marco Giotto says:

    Infelizmente, meu caro Carlos, com uma população de 7 bilhões e caminhando para 10 bilhões ainda neste século, fica cada vez mais difícil manter ecossistemas preservados de forma natural. Não há milagre. Enquanto não tratarmos da questão de superpopulação não teremos muito a fazer quanto aos seus impactos….mas isso é culturalmente muito difícil, o que torna a solução desse dilema preservacionista cada vez mais distante….

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