CASCAS DE CEDRO (Cedrella fissilis) NO TRATAMENTO DE METRITES EM BOVINOS

João Vasco Bandeira Dutra Júnior1*; Sandra Aparecida dos Santos2

Introdução: As metrites em bovinos são infecções que ocorrem no animal fêmea na condição pós-parto, decorrentes de contaminações bacterianas ou lesões provocadas no útero dos animais no momento do parto; o que faz com que sua ocorrência seja frequente. Os sintomas infecciosos consistem em aumento de temperatura, queda de produção de leite, anorexia, ocorrência de muco vaginal purulento, entre outros. A experiência aqui relatada refere-se à prática clínica de campo realizada na região do Alto Vale do Itajaí, interior do estado de Santa Catarina, por um médico veterinário e produtores rurais. Nessa região assim como em toda a extensão do bioma Mata Atlântica encontram-se facilmente duas espécies de cedro, árvore do gênero Cedrus (gimnospermas), da família das meliáceas, o cedro rosa (Cedrella fissilis) também conhecido como cedro missioneiro e o cedro cheiroso (Cedrella odorata); nos tratamentos aqui referenciados sempre se utilizou o cedro rosa (Cedrella fissilis). O objetivo desse relato é compartilhar experiências assertivas no tratamento de metrites em bovinos a partir de um fitoterápico disponível naturalmente, assim como de manipulação e aplicação acessíveis. 

Desenvolvimento: Os produtores da região citavam o cedro como uma planta com potencial para tratamentos infecciosos, utilizado tanto para a saúde humana quanto para a saúde animal. Nos atendimentos a campo, sabedor dos potenciais do cedro, o autor, médico veterinário, assumiu o tratamento das metrites com a preparação de uma solução a base de cedro, desde 2002. A solução preparada consiste em colher a casca do tronco da árvore de cedro (preferencialmente seca, já tenho sido utilizada in natura) e pô-la para ferver em água pura (aproximadamente 200g de casca – uma xícara – em 2L de água) por 10min (a partir da ebulição). Estando em temperatura ambiente procede-se a coagem para retirada das cascas e ministra-se a solução via oral, em uma prática de “garrafada”. Nos experimentos realizados, a garrafada foi repetida em um intervalo de 12h à 18h dependendo da gravidade do caso e da produção de muco uterino (indica o teor do quadro infeccioso); até o momento não houve a necessidade de uma terceira repetição, a redução dos sintomas infecciosos ocorreu a partir da segunda aplicação; uma vez que se mantendo a gravidade dos sintomas, associa-se o tratamento alopático com antibióticos de amplo espectro e medicamentos hormonais. Estima-se a realização de quinze tratamentos por ano, totalizando aproximadamente, trezentos casos em quase duas décadas de atendimentos, com uma média de 85% de eficácia. Ao longo do período de utilização do tratamento relatado evidenciou-se vantagens expressivas nos animais que responderam a ação do fitoterápico, como não ter resíduos medicamentosos na carne ou no leite, representar um tratamento de baixo custo com resultados rápidos, em poucas horas, sem alterações no ciclo estral das vacas causadas pelos medicamentos hormonais quando ministrados de forma indiscriminada para este fim. 

Conclusões: Com todos os tratamentos realizados, evidenciou-se a clara, efetiva e até mesmo rápida ação anti-inflamatória e anti-infecciosa (pela presença de taninos que se relacionam com a função de adstringência) do fitoterápico utilizado. Durante o período de aproximadamente duas décadas, a observação de cada caso permitiu comparar efeitos do fitoterápico na saúde animal em relação aos medicamentos comumente utilizados nos tratamentos de metrites; sendo eles, hormonais como ocitocina sintética, prostaglandinas e/ou antibióticos, geralmente de amplo espectro e de alto poder residual, usados para este fim. Não há a intenção de negar tratamentos convencionais alopáticos, mas sim compartilhar uma nova e prática opção não sintética ou a ela associada no tratamento das metrites, afecções tão comuns e de elevado prejuízo tanto para o produtor quanto para o animal enfermo.

1 João Vasco Dutra Jr. , méd. vet, Prefeitura de Atalanta/SC: jveterinario10@yahoo.com.br  

2Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí (Unidavi)

RESÍDUO DA MANDIOCA PARA CONTROLE DE CARRAPATOS

Por Paulo Márcio Barbosa de Arruda Leite*

A mandioca é uma planta dicotiledônea, pertencente à família Euphorbiaceae e ao gênero Manihot, tendo sua origem nas Américas. Este gênero Manihot apresenta uma grande variedade de espécies, contudo a única utilizada para alimentação é a Manihot esculenta Crantz, que pode ser da variedade brava ou mansa, em função do teor de glicosídeos cianogênicos, que liberam o ácido cianídrico (HCN).

Durante o processo de fabricação da farinha, sai um liquido amarelo resultante da prensagem das raízes da mandioca, que se chama manipueira. Este liquido é rico em compostos orgânicos e minerais, podendo ser utilizado em atividades agrícolas como inseticida, bactericida, fungicida, nematicida, adubo foliar, no controle de ervas daninhas, ou em atividades agropecuárias, como alimentação animal e no combate a ectoparasitas, em especial a carrapatos.

Este liquido é considerado um resíduo e pode ser facilmente encontrado em regiões que processam a mandioca, praticamente a custo zero. Ele vem sendo desprezado e se tornado um problema ambiental, quando lançado indiscriminadamente, contaminando solos e lençóis freáticos, devido ao alto teor do glicosídeo cianogênico linamarina, que eleva o efeito tóxico deste resíduo. São esses glicosídeos que ajudam a combater e/ou controlar a incidência de carrapatos nos animais de produção, principalmente bovinos, caprinos e ovinos.

Relatamos a seguir nossa experiência com o uso da manipueira para controle de carrapato em bovinos, que é uma opção muito barata e também viável para os sistemas orgânicos de produção, onde os carrapaticidas sintéticos não podem ser usados. Sabemos também que para o efetivo controle do carrapato em regiões muito infestadas, são necessárias um conjunto de ações, tais como a busca de raças mais rústicas e adaptadas as condições climáticas da região e ações no ambiente para diminuir a infestação das pastagens.

USO DA MANIPUEIRA

A manipueira vem sendo usada como carrapaticida em oito bovinos sem padrão racial definido, no Serviço de Tecnologia Alternativa – SERTA, organização que oferece o curso Técnico em Agroecologia, estado de Pernambuco. Por ser um produto liquido, utilizamos a manipueira pulverizando os animais. O resíduo pode ser usado uma vez ao dia, repetindo a aplicação duas vezes por semana em casos de maior infestação. Para animais com baixa incidência e/ou sem carrapatos, utilizamos uma vez por semana, com intervalos de 15 a 21 dias, respectivamente.

A frequência de uso será de acordo com o grau de infestação de carrapatos. O resultado das aplicações acontecem a médio prazo, com quatro a cinco pulverizações. Entretanto, esses resultados dependem do teor de HCN da manipueira, podendo aumentar ou diminuir o número de vezes em que o liquido será administrado. Pode ser utilizado também em caprinos e ovinos.

Vale lembrar que, o seu uso deve ser imediatamente após a sua formação (alto teor de HCN), que se dá mediante a moagem da mandioca. A manipueira não deve ser usada com diluentes, para evitar redução do teor de HCN e, consequentemente, do potencial carrapaticida.

O uso da manipueira no combate à carrapatos não tem contraindicações para animais debilitados ou jovens, podendo ser aplicado em qualquer horário do dia, desde que sem chuva. É uma forma sustentável e natural de reaproveitamento de resíduos, agregando valor econômico a um subproduto muitas vezes desprezado no ramo agropecuário, reduzindo custos com a produção animal no quesito medicamento, além de dirimir problemas ambientais.

 

*Paulo Márcio Barbosa de Arruda Leite é Zootecnista pela UFRPE, mestre em nutrição e produção animal pela mesma instituição. Professor do curso Técnico em Agroecologia do Serviço de Tecnologia Alternativa – SERTA, em Glória do Goitá – PE. Contato: pmbaleite@gmail.com.

 

USO DE PLANTAS BIOATIVAS E MEDICINAIS EM ANIMAIS

 

Por Angela Escosteguy*

As plantas medicinais brasileiras não curam apenas, fazem milagres, afirmou Von-Martius, médico e botânico alemão que veio ao Brasil com a comitiva científica acompanhando a Duquesa Leopoldina em 1817. Martius ficou pouco  no Brasil, mas foi tempo suficiente para se apaixonar pelo tema e, a partir daí, dedicar sua vida ao estudo da flora brasileira. Posteriormente coordenou uma equipe de botânicos para escrever a maior obra de botânica sore o Brasil, a “Flora Brasiliensis”, terminada em 1906, após a sua morte. Martius teve a sabedoria e a humildade de aprender com os índios e colonos brasileiros e submeteu estas informações a seu método científico.

O interesse e o uso de plantas bioativas e medicinais nas criações de animais vem aumentando consideravelmente devido a um conjunto de fatores: o alto custo dos medicamentos sintetizados, a resistência crescente às drogas químicas, a preocupação com resíduos tóxicos destes medicamentos nos alimentos e no ambiente e, ao desenvolvimento dos sistemas orgânicos e de base agroecológica de produção animal.

Este contexto vem impulsionando fortemente o uso de plantas ou seus extratos tanto na prevenção (plantas bioativas) quanto na recuperação da saúde dos animais (plantas medicinais). Inúmeros países especialmente na Ásia, África e América Latina têm tradição no uso de plantas medicinais. O Brasil tem uma expressiva diversidade genética, atualmente com 55 mil espécies catalogadas, a maioria nativas, o que mostra o enorme potencial medicinal que temos para estudar. O conhecimento popular sobre uso de plantas bioativas e medicinais é proveniente principalmente de índios brasileiros e vêm tendo sua necessária comprovação científica e, assim, ganhando espaço e credibilidade.

Apresentamos a seguir o resultado de estudos, realizados no Brasil, de várias plantas que tiveram sua ação cientificamente comprovada por organismos oficiais, assegurando sua eficácia para serem correta e eficazmente utilizadas. Selecionamos plantas que tiveram bons resultados (mínimo de 70% de eficácia) em testes laboratoriais e/ou a campo sobre alguns dos principais problemas das criações de animais na atualidade.

 

 

 

 

            AÇÃO ANTI-PARASITÁRIA

 

A Tabela 1 a seguir mostra as plantas que comprovaram ação contra parasitos internos e externos de diversas espécies de animais. A administração de planta ou seus extratos ocorreu diretamente nos animais por via oral ou dermal (banhos).

 

 

            PLANTA USO AÇÃO ANIMAIS
Musa sp.

(Bananeira)

 

Folhas

(via.oral)

Haemonchus spp, Cooperia spp, Trichostrongylus spp  Oesophagostomum spp. Bovinos  e caprinos
Azadiractha indica (Nim) Pó ou óleo

(via oral. ou banho)

Carrapato, berne,

mosca do chifre

Bovinos e bubalinos
Cucurbita spp (Abóbora) Sementes torrada (via .oral) Parasitos internos

 

Galinhas
Chenopodium ambrosioides (Erva-de-santa-maria*)

Allium sativum (Alho*)

Folhas secas

( via.oral)

 

 

extrato

(via oral)

 Haemonchus, Ostertagia,

Cooperia,

Trichostrongylus  Strongyloide

Ovinos

 

 

 

A Tabela 2 demonstra a ação anti-parasitária de extratos de plantas aplicados no solo, em local do pernoite de  animais, para  combater as larvas de moscas .

 

 

PLANTA NOME POPULAR Eficácia de controle das larvas
Azadiractha indica Nim indiano 94,4%
 N. tabacum Fumo 90,4%
Allium sativum Alho 86%
Syzygium aromaticum Cravo da índia/ 88,3%

 

 

         AÇÃO ANTIMICROBIANA

A Tabela 3 mostra estudos realizados pela Faculdade de Veterinária da UFRGS, onde extratos hídricos ou alcoólicos de plantas comprovaram sua ação frente a microrganismos patogênicos. Os resultados identificaram quais plantas que poderão ser usadas como desinfetantes de feridas e úbere de animais, assim como anti-sépticos para utensílios de ordenha e ambiente de coleta, manipulação e processamento de alimentos.

 

PLANTA NOME POPULAR NO BR AÇÃO

 

Baccharis trimera Carqueja Gram positivos:  Staphylococcus aureus e Staphylococcus uberis
Hypericum caprifoliatum Escadinha Staphylococcus aureus
Allium tuberosum Alho nirrá Salmonella,  Escherichia coli
Achyrocline satureioides Macela Salmonella,  Escherichia coli, Sataphilococcus aureus
llex paraguariensis Erva-mate Salmonella,  Escherichia coli

 

          

 

 

PLANTAS USADAS  PARA CONTROLE DO CARNUNCHO EM

  TABELA 4 – AÇÃO INSETICIDA EM MILHO ARMAZENADO

 

A Tabela 4 mostra que extratos de plantas são úteis para combater o caruncho: Sitophilus zeamais na conservação de milho armazenado.

 

 

PLANTA NOME POPULAR USO
Eucaliptus citriodora Eucalipto Camadas de folhas intercaladas
Caryophilus aromaticus Cravo-da-índia Camadas intercaladas
Azadirachta índica Nim Óleo aspergido

          

 

 

  DISCUSSÕES/ CONCLUSÕES

 

   Os resultados relatados comprovam que algumas plantas ou seus extratos possuem uma comprovada ação anti-parasitária ou antimicrobiana e podem ser usadas na medicina veterinária.  Embora as investigações sobre as plantas aumentaram muito na última década, muito ainda falta estudar para um real aproveitamento de todo o potencial da biodiversidade brasileira

A possibilidade da implantação de horto medicinais, verdadeiras “farmácias vivas” nas propriedades ou comunidades é real e fantástica pois representa também a independência da necessidade de comprar insumos de fora, mesmo que igualmente fitoterápicos. Claro que cada região deve usar preferencialmente espécies do seu bioma.

Entretanto, para que os resultados sejam eficazes, é fundamental conhecer bem todas as etapas do processo, que compreende a identificação, o cultivo, a coleta, o processamento, o armazenamento, a via de administração, as dosagens e o uso indicado para as diferentes espécies de animais. Outro desafio é a transferência destas informações para os produtores.

Referência (Disponíveis na Biblioteca Virtual deste Portal)

ESCOSTEGUY, A. Potential use of medicinal plants in animal production: results in Brazil.  4th

ISOFAR Scientific Conference. at the Organic World Congress 2014, 13-15 Oct., Istanbul, Turkey

*Angela Escosteguy é médica-veterinária e Presidente do IBEM. E-mail: ibembrasil.org@gmail.com